4 de set. de 2016

FITAS K7 - O RETORNO




Depois do vinil, agora é a vez de voltar a ouvir música com chiado de fundo com a volta das fitas cassetes.

Em São Paulo, o produtor musical e sócio do estúdio FlapC4 Fernando Lauletta aposta nesse mercado. O estúdio adquiriu em março uma máquina copiadora de cassetes, com investimento de R$ 50 mil. Ela tem capacidade de gravar até cem fitas por hora.

“Se não fosse por complicações de importação, já estaríamos produzindo essas primeiras 5.000 fitas que compramos”, disse Lauletta.

Há meses, o produtor tenta importar as fitas virgens, mas esbarra em burocracias locais, dos EUA e do Canadá. Desde 2000, as fitas não são mais fabricadas no Brasil.

Nos próximos meses, porém, elas já poderão ser, em parte, feitas por aqui. “Nós conseguimos um fornecedor que tem os moldes antigos e que fará a moldura plástica. A fita magnética será importada em rolos”, diz Lauletta.

As primeiras matrizes que chegarem serão para gravação de músicas de artistas independentes. “Essa procura é mais da galera do rock, do metal e do rap. São artistas que estão fora do mainstream [mercado comercial da música]. Eles vendem as fitas como suvenires em shows”, afirmou o produtor. O custo para a banda que for gravar suas músicas no cassete ficará entre R$ 11 e R$ 15.

A Livraria Cultura, a primeira livraria a colocar discos de vinil importados nas prateleiras, tem interesse em trazer os cassetes importados dos artistas que lançam seus produtos na velha mídia, mas ainda não há data para isso.
No Rio de Janeiro, um grupo de músicos da cena de rock independente carioca criou o Cassete Club, um projeto de gravações de singles em fita cassete, comandado por Lê Almeida e João Casaes.

Os artistas criaram um selo e têm lançado vários discos de bandas independentes em cassetes. “Sempre tive envolvimento grande com essa mídia. Existe uma textura de som que só se alcança com a fita”, afirma Almeida.

Eles gravam as matrizes e mandam para uma fábrica na Argentina com tiragem de até cem unidades. O custo de uma fita produzida no país vizinho é de R$ 8. As bandas costumam vendê-las por R$ 20. O preço é inferior ao praticado no lançamento de um CD, em torno de R$ 35. Já um vinil nacional custa cerca de R$ 90.

Segundo Almeida, ter um fabricante de cassete no Brasil seria muito bom, já que a demanda está crescendo e o limite de tiragem para produzir na Argentina impede o aumento da produção.

Ele associa o aumento da procura à crise econômica, pois os custos das fitas são bem menores do que prensar o vinil e até mesmo o CD.
Os fãs da fita são unânimes em afirmar que quem procura a música na sua forma mais crua, como nos formatos analógicos, sabe apreciar o momento de ouvir um disco por completo.

Se você tem de 20 anos de idade ou menos, pode estar pensando: “Tá, mas do que estamos falando mesmo?”. Houve um tempo pré-internet, anterior até mesmo ao CD, em que as pessoas saíam pelas ruas com um aparelho chamado walkman.

Perto dos 130 gramas do iPhone 6, parecia uma bigorna de quase meio quilo. Mas dava para escutar a música que desse na telha, sem ficar refém do rádio, nessa novidade portátil introduzida em 1979 pela japonesa Sony.

Dentro ia um dos últimos hits da mídia analógica: a fita magnética, que vinha enrolada dentro de um retângulo plástico e onde dava para capturar novos sons e reproduzir áudios pré-gravados.

Quem curtiria uma tecnologia tão obsoleta hoje? Jed Shepherd, dono da gravadora independente Post/Pop, de Londres, questiona a ideia de que, no universo das vendas físicas, CD é a melhor pedida.

À Folha ele repete a frase que mais ouviu ao abrir o selo: “Que isso, Jed? Não vai funcionar nem em 1 milhão de anos”. Em 24 meses, lançou fitas de 50 bandas, de veteranas (The Prodigy) a calouras, como a Gunship.

Em geral, são lotes pequenos, de 50 exemplares, alguns customizados —no lado B da Gunship, por exemplo, o britânico gravou a trilha de “Ataque dos Camelos Mutantes”, jogo do videogame Commodore 64 (1982-1994).

Vinis, legais de novo? Talvez na semana passada. Descolada mesmo (até agora) é a fita cassete. Abreviada para K7 no Brasil, a mídia magnética embarcou na mesma onda retrô que deu status cult aos LPs anos atrás.

Kanye West e Eminem estão entre os artistas que vêm lançando suas músicas na relíquia. As lojas da Urban Outfitters, satélites da geração milênio para as últimas tendências, vendem a preço médio de US$ 13 (R$ 41) essas e outras novidades não tão contemporâneas assim.

Uma delas é a trilha do filme “De Volta para o Futuro”, de 1985. Justin Bieber, outro que aderiu à mídia anciã, nasceu nove anos depois.

Lançado oficialmente em 1963, pela holandesa Philips, o K7 viveu seu auge nos anos 1980 e atravessou as últimas décadas no modo zumbi.

Sucateado pelas novas tecnologias, sobreviveu se agarrando a rincões do mercado —fitas com mensagens religiosas, por exemplo, continuaram populares, sobretudo no interior.

O livro “Retromania”, sobre cultura pop, tem uma tese para explicar por que os cassetes voltaram à moda: se nos anos 2000 o barato era revisitar gêneros musicais, o fetiche atual é por mídias antiquadas.

“Todo o mundo quer bancar o arqueólogo”, diz Marcelo Conter, autor de “Lo-Fi - Música Pop em Baixa Definição”.

Para Conter, dois motivos justificam o retorno da fita: 1) Elas são mais baratas —na Urban Outfitters, um LP custa em média duas vezes mais; 2) Em termos de qualidade, há quem veja diferencial.

“Ela tem textura sonora diferente, mais quente, e o fato de dificultar pular as faixas privilegia a audição contínua, o que favorece álbuns conceituais”, afirma Conter.
Enquanto continuar apostando num nicho, o cassete deve passar bem. No mercado desde 1969, a americana National Audio Company fabrica anualmente cerca de 20 milhões de fitas, virgens (sem nenhum áudio) ou pré-gravadas.

Após anos de sufoco, as vendas da companhia aumentaram 31% em 2015. Até junho deste ano, “estão muito além da primeira metade do ano passado”, diz Steve Stepp, presidente da empresa (que não divulga o lucro).


Lado A, Lado B

É possível gravar dos dois lados da fita. Dependendo do comprimento, permite diversas durações de gravação. A mais comum é de 60 minutos, sendo 30 minutos de cada lado.

Fita Virgem

É possível comprar a fita virgem, em branco (que não tem nenhum áudio gravado), ou com música gravada. Além disso, também é possível regravar em cima da gravação anterior.

POR QUE SAIU DE MODA

·         Nos anos 1980, as fitas foram consideradas ameaça à indústria musical pelo seu potencial de gravação simplificada e de pirataria
·         Com a difusão dos CDs, seguida pela ampliação do acesso à internet, as fitas perderam popularidade.
POR QUE ESTÁ VOLTANDO

·         A novidade acompanha a onda retrô que recuperou o prestígio dos discos de vinil
·         Nos últimos anos, as fitas ganharam status de cult e voltaram a conquistar espaço
·         O principal público vem do mercado independente, como bandas de punk e metal.

Mídia traz peculiaridades, diz colecionador

DE SÃO PAULO

Para um colecionador, a fita cassete não é apenas um fetiche e muitas delas trazem peculiaridades únicas.

O colecionador Ezio Zoyd tem cerca de mil fitas cassetes e uns 30 tipos de toca-fitas em seu apartamento. As fitas estão carregadas de histórias que ele conta com muito entusiamo.

“Algumas bandas lançam material exclusivo só em cassete. Na 'Record Store Day' [evento mundial que reúne selos e gravadoras], por exemplo, os artistas fazem questão de lançar um produto específico. Uma banda que sou fã, a Goldfrapp, lançou esse ano cem fitas cassetes com músicas exclusivas”, conta Zoyd.

Segundo o colecionador, os cassetes também são envolventes devido aos encartes específicos, como uma versão do álbum Axis: Bold as Love, segundo The Jimi Hendrix Experience, lançado em 1967 e relançado recentemente.

“Essa fita do Hendrix vem com uma observação polêmica na capa, um adesivo que informa que a remasterização foi autorizada pela família dele, que detém os direitos autorais. Na época, eles haviam processado uma gravadora que relançou gravações inéditas sem autorização”, afirma Zoyd.

Fonte: Site Uol

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