Por Natan Castro
Lobão é
reconhecidamente um talentosíssimo multi-instrumentista, de todos os
instrumentos de corda somente o baixo o músico ainda não havia se aprofundado
nos estudos, algo que aconteceu em o Rigor e a Misericórdia. A concepção desse
disco é um sonho antigo de criar um álbum seguindo o estilo One-Man, que nada
mais é que realizar todo o processo de produção de um disco completamente
sozinho. O disco está calcado na sonoridade do rock setentista período que
Lobão conhece com propriedade, suas principais referências vem de lá com nomes
como Grand Funk Railroad e Led Zeppelin, logo nos primeiros instantes de
Overture o tema de abertura do álbum, podemos sentir algo de épico no ar, algo
que se faz perceber durante todo o disco, o acetato sonoramente está entre o
hard rock setentista e o Arena Rock do inicio dos anos 80, tudo isso se
constata quando Lobão abre um baú de acordes in virtuose, com nossos elogios aos
interessantes solos de guitarras, sempre muito bem imaginados em timbres muito
bem encaixados por sinal, exímio baterista, ele em algumas passagens chega a exagerar
nas viradas, saturando o papel da bateria no andamento de algumas músicas. Não
há dúvidas que o Rigor e a Misericórdia é um grande disco, o amadurecimento de
Lobão referente às letras com o passar dos anos ficou visível, aos poucos Lobão
deixou de lado as parcerias do passado com letristas e passou a forjar a partir
de suas leituras um letrista dentro de si. Saber traduzir e transpor todo o
arcabouço literário que ele nunca escondeu de ninguém como parte integrante de
suas músicas, é algo que o diferencia de muitos no meio, foram poucos os
letristas de um Brasil recente que transformaram reflexões criticas do
cotidiano em grandes canções como A marcha dos infames, A posse dos Impostores,
Os vulneráveis e O rigor e a Misericórdia, essas quatro músicas conseguem ter
uma profundidade político-social que em contrapartida não encontramos num “Nhengattu”
do Titãs, outro grande disco de rock de teor político do Brasil contemporâneo.
O Rigor e a
Misericórdia num campo estético traduz o momento apocalíptico e crucial que a
democracia brasileira passa, não fosse somente isso ele é um dos pontos altos
da carreira de um artista que vem com o passar dos anos realizando uma espécie
de passagem para um estágio visceralmente oposto ao anterior. Lobão conseguiu
transmutar uma imagem de roqueiro tresloucado sem papas na língua, para uma
espécie de “gurú” de uma leva cada vez maior de artistas independentes, junte-se
a isso sua luta por direitos autorais e sua persona on-line recheada de
apontamentos críticos aos negros anos do PT a frente da direção da nação. Esse novo
momento inclusive é muito parecido, mas claro guardadas as devidas proporções, com
a fase de John Lennon de Nova York. Lobão
nesse disco só peca quando suaviza o discurso, em canções de teor idílico,
recheadas de imagens poéticas que constratam totalmente com o restante das
músicas, ao que nos parece apesar desse profundo amadurecimento o artista ainda
não consegue dosar as duas coisas, algo que era marca de outros grandes nomes
que surgiram nos anos 80. No mais o disco representa os primeiros instantes da
chegada da fênix a um Brasil quase brilhante de luz, mas ainda repleto do fogo
negro das ideologias retrógradas.
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Let´s rock baby